Inovação e produtividade na construção civil
Em um célebre artigo publicado em fevereiro de 2017, com o título “Reinventing Construction: A Route to Higher Production”, o McKinsey Global Institute apresenta um interessante estudo comparativo entre o setor da Construção Civil, a Indústria e outras áreas da economia, o qual revela uma grande discrepância de produtividade entre os mesmos. Os resultados são bem desfavoráveis para o mercado da construção, como se pode constatar a partir dos dados publicados, sumarizados abaixo:
• Globalmente, o crescimento da produtividade do trabalho no setor de construção foi em média 1% ao ano nas últimas duas décadas, em comparação com 2,8% para a economia mundial total e 3,6% para a Indústria;
• Na amostra de países analisados, menos de 25% das empresas de construção atingiram o crescimento de produtividade alcançado nos mercados onde atuaram na última década.
Em contrapartida, o setor da construção é um dos mais robustos da economia mundial, com cerca de US$ 10 trilhões gastos todos os anos em bens e serviços relacionados ao negócio. Estima-se que há uma oportunidade de ganho da ordem de US$ 1.6 trilhão se este gap de produtividade for superado. Este montante é suficiente para suprir metade da demanda mundial anual de infraestrutura e corresponde a um aumento de cerca de 2% do PIB global.
Como principais causas para este baixo desempenho, destacam-se algumas condições impostas (1-3), práticas correntes do setor (4-6) e fatores de natureza operacional (7-10), a saber:
1. Aumento da complexidade do projeto e do site de construção;
2. Regulamentação excessiva, muito dependente da demanda do setor público e altamente cíclica;
3. Distorções decorrentes de informalidade e potencial de corrupção;
4. Mercado opaco e altamente fragmentado;
5. Contratos com desajustes nas alocações de risco e recompensas;
6. Falta de objetividade e padronização nos requisitos e especificações dos empreendimentos;
7. Projetos e investimento inadequados;
8. Má gestão e execução das obras;
9. Mão-de-obra sem qualificação adequada nas frentes de serviço e nos níveis de supervisão;
10. Sub-investimento em P&D e Inovação.
Para superar estes problemas, os autores sugerem as seguintes ações que, aplicadas em conjunto, podem potencialmente incrementar a produtividade do setor entre 50 e 60%, com uma redução de custos que pode atingir de 30 a 40%, além de aprimorar a qualidade / precisão das atividades de planejamento e orçamento, a saber:
1. Reformular a regulamentação e aumentar a transparência, para reduzir a informalidade e a corrupção;
2. Reformular o quadro contratual, mais colaborativo e direcionado à solução de problemas;
3. Repensar a concepção e os processos de Engenharia, com maior foco em “constructability” e padronização;
4. Aprimorar a gestão de compras e a cadeia de suprimentos;
5. Aprimorar as práticas de execução nos canteiros;
6. Incentivar a adoção de tecnologia digital, novos materiais, e automatização avançada;
7. Capacitação da força de trabalho.
Embora as medidas listadas nas alíneas 1 e 2 dependam também (e substancialmente) de ações regulatórias e de ordem jurídica, a implementação das soluções propostas (notadamente aquelas descritas nas alíneas 3-7) podem ser facilitadas / viabilizadas através de iniciativas potencializadas pela Inovação.
Neste cenário, destacam-se a grande transformação digital da construção proporcionada pelo BIM (Building Information Modelling) e a metodologia VDC (Virtual Design and Construction) como uma forma eficiente de implementá-la. O BIM como ferramenta, e o VDC como estratégia,
• Tornam o processo como um todo mais transparente, previsível e colaborativo (1-2);
• Permitem estudos eficientes e conclusivos de “constructability” e promovem /favorecem a padronização – na verdade, trata-se de um requisito de implementação (3);
• Viabilizam uma transformação digital robusta do canteiro de obras, que passa a constituir uma verdadeira plataforma digital na qual se “plugam” novas tecnologias da Industria 4.0 (IoT, Big Data, Digital Twins, tecnologias Cloud, gestão digital de obras, integração com softwares de back office, etc.) que favorecem a automação e a eficiência (4-6);
• A migração para o BIM exige capacitação e aprimoramento técnico da mão-de-obra empregada pela indústria da Construção Civil, algo que representa um salto qualitativo deste setor (7).
A tecnologia hoje disponível oferece ao mercado um arsenal de recursos, além dos citados acima, que podem levar a Construção Civil para outro patamar de qualidade e produtividade, comparável à Indústria – e estes benefícios são, pelo menos em parte, extensíveis também à Construção Pesada, que por natureza, é menos passível de sistematização (pré-fabricação/modularização).
Através da Inovação, é possível vencer a inércia hoje observada no setor da construção e assim diminuir o gap de produtividade constatado nos últimos anos em relação a outras atividades econômicas, conforme discutido neste artigo. Esta qualificação do setor pela tecnologia viabiliza as oportunidades de ganhos vultosos acima identificadas, permitindo à indústria da Construção Civil almejar o lugar de destaque e a importância que lhe cabe na economia global, e prover a demanda de infraestrutura necessária ao desenvolvimento que o mercado requer.
Sobre os autores:
Daniel Lepikson Oliveira é Engenheiro Mecânico e Civil, Mestre e Doutor em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EPUSP). Especializado em Engenharia de Estruturas, trabalhou como Engenheiro Civil no Setor de Processos Construtivos da Odebrecht de 2008 a 2017. Posteriormente, integrou a equipe de engenheiros calculistas da empresa alemã sbp – schlaich bergermann partner, em Stuttgart, Alemanha durante o ano de 2018.
Atualmente está no Setor de Engenharia da OEC e é responsável pela implementação de um programa de inovação na empresa.
Adhemar Bragança é Engenheiro Eletrônico formado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Trabalha como Analista de Sistemas da OEC desde 1998, na área de Engenharia.